Três artistas renomados na cena nacional – Albano Afonso, Barrão e Luiz Zerbini – e três experientes curadores – Douglas de Freitas, Felipe Scovino e Marcelo Campos – são destaques no calendário de artes visuais da unidade de cultura do Santander em Porto Alegre.
O Santander Cultural lança a exposição Zerbini, Barrão, Albano, dia 23 de maio, às 19h, e segue a temática da instituição em 2017: inovar e dar ênfase ao ofício curatorial. Três artistas distintos estão reunidos em uma mesma exposição, Albano Afonso, Barrão e Luiz Zerbini; com curadoria de Douglas de Freitas, Felipe Scovino e Marcelo Campos, respectivamente. A mostra apresenta 43 obras em pintura, gravura, escultura e fotografia, que se direcionam pelos caminhos da instalação e potencializam as vozes individuais de cada artista. O resultado é uma grande exposição com multiplicidade de gestos, discursos e interesses no campo artístico da cena contemporânea.
Marcos Madureira, vice-presidente executivo de Comunicação, Marketing, Relações Institucionais e Sustentabilidade do Santander Brasil, afirma que “a exposição confirma nossa proposta de evidenciar a importância do trabalho curatorial na agenda de artes visuais da região Sul do País. Acreditamos na valorização de artistas de diferentes correntes e tendências, sempre com foco na originalidade e vanguarda para incentivar a curiosidade e a inquietude pela inovação”.
Zerbini, Barrão, Albano é o resultado do processo de criação de uma exposição que envolve profissionais de naturezas distintas, mas que, hoje, funcionam em consonância, tanto para a potencialidade de uma exibição quanto para mediar ideias que possam chegar ao público de forma ampla e irrestrita. Para a exposição, os artistas advindos de épocas aproximadas da arte brasileira, a partir dos anos 1980, estão acompanhados por profissionais também de gerações análogas, surgidos a partir dos anos 2000.
A mostra traz uma multiplicidade de gestos, discursos, interesses e propostas diferentes, sem estabelecer qualquer compromisso geracional ou identitário de nação, região ou suporte artístico. Nesse sentido, são três exposições cujas paredes ou qualquer tipo de barreira entre elas foram desmontadas. Aproximam-se ao mesmo tempo em que expõem as suas diferenças e zonas de interesse.
A curadoria, atividade já exercida, mas nem sempre nomeada desta maneira, se tornou mais recorrente a partir dos anos 1970, quando o curador Harald Szeemann reuniu artistas e obras, experimentando uma ideia de diálogo não mais puramente morfológico ou temporal, na mostra “Quando atitudes se tornam forma”. No Brasil, nomes como Walter Zanini, por exemplo, exerceram papel pioneiro. Nesse âmbito, em programas como o Jovem Arte Contemporânea, idealizado por Zanini e realizado no MAC-USP entre 1967 e 1974, ou em eventos de grande porte, como a Bienal Internacional de São Paulo, uma ideia norteadora se tornara fundamental para que a ocupação do espaço expositivo se desse de modo narrativo, diante da árdua tarefa de reunir mais de uma centena de artistas de todos os continentes.
Santander Cultural apresenta Zerbini, Barrão, Albano
Santander Cultural apresenta Zerbini, Barrão, Albano
Coquetel de abertura para convidados | 23 de maio, 19h
De 24 de maio até 16 de julho
Rua Sete de Setembro, 1028 | Centro Histórico
Ação educativa 51 3287.5941
Números da exposição
43 obras
Zerbini | 16 monotipias + 3 mesas + 4 pinturas de grande formato = 23 obras
Barrão | 9 esculturas + parede de isopor (site specific) = 10 obras
Albano | 5 instalações + 5 fotografias (sendo um tríptico) = 10 obras
Albano Afonso por Douglas de Freitas
Os trabalhos de Albano Afonso partem de uma reflexão de assuntos, gêneros e temáticas provenientes da história da arte, principalmente da história da pintura, apresentando, não por coincidência, a questão “luz e sombra” como elemento central. Luz e sombra conferem volumetria às pinturas de natureza-morta, dramaticidade às pinturas históricas, mistério e melancolia às pinturas de paisagem, poder e força aos retratos e autorretratos. Junta-se a esse princípio a fotografia como técnica, meio e pensamento. Com invenção da fotografia, o real pode ser captado pela imagem fotográfica, a pintura se liberta de sua função representativa de imortalizar uma situação ou pessoa, podendo, e precisando, se reinventar. Vale lembrar que o processo fotográfico se faz por luz. É a luz rebatida pelos objetos, que, através da lente, marca o filme, e posteriormente é também a luz que atravessa o filme e grava a imagem no papel. As imagens, instalações e objetos produzidos por Albano estão irradiados por essas ideias. Suas esculturas são naturezas-mortas de luz. Ossadas, frutas e jarros revestidos de espelhos perdem a definição clara que suas matérias lhe conferem para refletir luz, ou em alguns casos, quando fundidos em bronze, para negá-la. Afinal, luz e sombra, apesar de opostas, andam sempre ligadas e são inseparáveis. A existência de uma depende da ausência da outra, ou de uma constante batalha de existência compartilhada. Por vezes, apenas em bronze, as esculturas são banhadas por luz e se projetam encenando situações, ou criando ambientes imersos numa atmosfera construída por projeção onde os cristais e espelhos replicam a luz. Brilho, reflexo e refração se tornam objeto de estudo, parte indissociável das obras. Se, nas esculturas, a presença do artista está convertida em partes do corpo fundidas em bronze, ausentes de vida, mas moldadas a partir do próprio artista, nas imagens se apresentam em traços fantasmagóricos, em que sua presença surge evanescente. É essa a alquimia que Albano opera: luz e corpo se convertem em matéria sólida e opaca, e matéria sólida e opaca se converte em imaterialidade e luz.
Albano Afonso nasceu em 1964, na cidade de São Paulo, onde vive e trabalha. Cria instalações e fotografias, nas quais mistura impressões fotográficas, esculturas com imagens projetadas no espaço. Por meio da luz e do movimento, um jogo de percepções desvela imagens que exploram o espaço construído como parte ilusória da realidade. Entendendo a luz como elemento pictórico, configura diferentes perfis plásticos revisitando as referências clássicas desde outros pontos de vista, criando arquiteturas renovadas para uma mesma paisagem de luzes e sombras. Algumas das exposições individuais dos últimos anos: Em Estado de Suspenção (Museu Brasileiro de Escultura (MUBE), São Paulo, 2016), Self Portrait as Light (21CMuseum, Louisville, EUA, 2015; Contemporary Arts Center, Cincinnati, EUA, 2015; e 21CMuseum, Cincinnati, EUA, 2014), Anatomia da Luz (Oi Futuro, Rio de Janeiro, 2011), Amor Fati (Museu de Arte de Ribeirão Preto, 2011), O Homem Luz – Viva o Nosso Rei (CarpeDiem Arte e Pesquisa, Lisboa, Portugal, 2011) e A Natureza (intervenção no Hospital Edmundo Vasconcelos, São Paulo, 2011).
Barrão por Felipe Scovino
O trabalho de Barrão nasce em meio a uma nova conjuntura política do país. No início dos anos 1980, o Brasil estava imerso numa atmosfera de expectativa e esperança com a redemocratização. Nesse ínterim, a cultura assiste à chegada do rock, da new wave, dos grandes festivais de rock, da poesia marginal fruto da geração mimeógrafo e em especial, no Rio de Janeiro, à criação do Circo Voador e do grupo Asdrúbal Trouxe o Trombone, duas importantes referências para o trabalho de Barrão, assim como de Luiz Zerbini. Desde o início, sua carreira artística se dividiu em projetos colaborativos, seja com outros artistas plásticos (caso do grupo musical e performático Chelpa Ferro), seja em trabalhos como designer, desenvolvendo capas de disco (para Os Paralamas do Sucesso, Lenine, Herbert Vianna, entre outros). Já a sua produção artística foi marcada, até o final da década de 1990, por um uso bastante acentuado de aparelhos tecnológicos e objetos domésticos e, no começo dos anos 2000, pela série de obras tendo a louça como material e meio de produção. Em todas essas etapas, o artista sempre fez uso de colagem, seja na colaboração com outros artistas; na concepção estética de seus projetos voltados para o design em que a união de fragmentos dispersos ou encontros (aparentemente) aleatórios de imagens se fundiam, realizando um trabalho coeso para aquele projeto musical ou literário; ou, sobretudo, na colagem ou hibridismo que se acentuam em seu trabalho com os objetos tridimensionais. Eis o território de Barrão. Um lugar ficcional, construído por detalhes, minúcias, partes que compõem um todo. A experiência de adentrar esse mundo se dá de forma vagarosa, pois é preciso ver, analisar, sentir, esmiuçar um pensamento que demanda concentração e tempo. Não é possível perceber as obras numa olhadela rápida, mas compreender no seu próprio ritmo, na construção, portanto, de um tempo-duração subjetivo, o que está diante de nossos olhos. Esse tempo nos leva a decodificar os fragmentos, acessar as nossas memórias de modo a criar estratégias de compreensão e identificar e reconhecer nossas próprias percepções em relação a essas obras.
Barrão nasceu em 1959 no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha. A obra de Barrão surge nos anos 1980 feita da apropriação inventiva de objetos cotidianos. O artista inverte o sentido primeiro dos objetos, sempre com humor, ironia e poesia. Entre 1983 e 1991, integrou o grupo 6 Mãos com Ricardo Basbaum e Alexandre Dacosta, desenvolvendo atividades com vídeos, performances e objetos. Realiza a primeira individual, Televisões, em 1984, na Galeria Contemporânea. No mesmo ano, participa da exposição Como Vai Você, Geração 80?, realizada na Escola de Artes do Parque Lage, no Rio de Janeiro. Em 1990, recebe o Prêmio Brasília de Artes Plásticas. Hoje, o artista também faz parte do grupo Chelpa Ferro, criado em 1995, junto com Luiz Zerbini e Sergio Mekler. Dentre suas exposições, destacam-se Barrão (Galeria Camargo Vilaça, São Paulo, 1992), V Bienal de Havana (Havana, Cuba, 1994), I Bienal do Mercosul (Porto Alegre, 1997), 27º Panorama de Arte Brasileira (MAM-SP, São Paulo, 2001), Natureza Morta, Próximo Futuro (Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, Portugal, 2010), Mashups (Aldrich Contemporary Art Museum, Ridgefield, EUA, 2012), Fora Daqui (Casa França-Brasil, Rio de Janeiro, 2015), Lugar Nenhum (Galeria Fortes Vilaça, São Paulo, 2014) e Paleotoca (Galeria Fortes Vilaça, São Paulo, 2015).
Luiz Zerbini por Marcelo Campos
A paisagem, na pintura de Luiz Zerbini, adquire conotações variadas. Ora nos deparamos com ambientes mais desérticos, onde a presença humana parece rarefeita, ora observamos restos e vestígios da passagem de um acontecimento inapreensível, pois só nos restaram pistas espalhadas pelas areias das praias. Zerbini se direciona mais aos momentos seguintes da passagem humana por uma natureza idílica. Assim, os usos e excessos dos prazeres da civilização, as festas, os encontros, não deixam de ecoar sentidos de gozo, visões paradisíacas, ainda que não tenhamos acesso ao evento em seu momento pleno. Ao contrário, vemos imagens escaparem da acepção histórica e épica da representação. Em tudo, o sentido da gambiarra, do “contra-uso”, dos modos desestruturantes presentes nas arquiteturas espontâneas e, de certo modo, ingênuas. Vemos caixas de som, fiações, tudo hibridizado. Também vemos hibridizações naturais, bromélias que se misturam a outras espécies de vegetação, cores superpostas em camadas e combinações inusitadas. Zerbini busca, na imagem, sua contraposição. Também se interessa por malhas, tramas ortogonais, trazidas pela cultura de detalhamentos arquitetônicos, das empenas de prédios, de venezianas. Diante da plácida cena de uma paisagem, uma praia, por exemplo, vemos o sentido de oposição quando a cena (rasgada) se transforma pela destruição causada por uma onda. O artista insiste, força a imagem, repete padrões, modificando-os e encontrando falhas. O excesso de ornamentos, que já nasce do excesso de gestos repetidos, ativa, a partir da intensidade do uso, vinculações ampliadas na cultura e na sociedade. Porém, a mesma intensidade de uso nos incapacita, ao olharmos a produção do artista, para o reconhecimento literal e concatenado das mensagens. Não estamos diante de uma aldeia, tampouco reconhecemos casas modernistas. Ao contrário, os signos se adensam em pedaços de varandas, sacadas, que, de modo enigmático e metamorfoseado, não nos deixam adentrar a casa.
Luiz Zerbini nasceu em São Paulo, em 1959, e iniciou sua atividade artística no final dos anos 1970. Sua obra transita entre a pintura, a escultura, a instalação, a fotografia, a produção de textos e o vídeo. É um dos integrantes do Grupo Chelpa Ferro, criado em 1995, que realiza instalações sonoras, performances e shows. Com uma paleta rica e luminosa, Luiz Zerbini produz desde imagens de cenas domésticas, paisagens naturais e urbanas até imagens abstratas. O artista justapõe estilos e técnicas, padrões orgânicos e geométricos, campos de luz e sombra, produzindo efeitos ópticos que convidam à contemplação. Zerbini vive e trabalha no Rio de Janeiro desde 1982.
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