Luís Eduardo Gomes
Desde a última terça-feira (1°), frequentadores do Bar Pinacoteca (Rua da República, 409) podem conferir a intimista e autobiográfica exposição do premiado cartunista gaúcho Rafael Corrêa. Ganhador de 27 prêmios internacionais, o artista lida, desde 2010, com a esclerose múltipla, doença degenerativa que causa lesões cerebrais e medulares e que afeta, especialmente, os movimentos de seus portadores.
Corrêa conta que a ideia para a exposição surgiu pouco tempo depois de ser diagnosticado com a doença, em 2010. “Como sempre fui cartunista e contador de histórias, me dei conta de que tinha uma grande história para contar”. Após “se enrolar” por um tempo para começar, Corrêa começou a desenhar em julho de 2015. “É um assunto delicado, ainda mais colocando as minhas fraquezas. Demorou um pouco para eu ter coragem de colocar no papel”, afirma.
A partir de então, ele começou a publicar seus desenhos autobiográficos na página “Memórias de um Esclerosado”. “Logo que eu lancei, me assustei com a quantidade de gente. Em dois dias tinha duas mil curtidas”, conta Corrêa. Atualmente, a página conta com 8,6 mil likes.
A Exposição na Pinacoteca traz as 12 primeiras páginas produzidas por Corrêa, que representam o primeiro capítulo do projeto. No Facebook, porém, ele já divulgou mais páginas – já são 20 concluídas até o momento.
Este primeiro capítulo, que estará em exposição até o final de março, versa sobre o momento em que ele descobriu a doença. Corrêa conta, porém, que, por ter caráter autobiográfico, não há prazo para terminar o projeto e que também não há tema definido para os quadrinhos que ainda estão apenas na sua cabeça. “Como eu estou contando minha história, todo dia acontece uma coisa nova que pode virar uma nova página. Até as coisas mais banais, como escovar os dentes, pode virar uma história”, diz.
Rafael conta que, a partir do Facebook, acabou notando que o trabalho teve uma resposta muito positiva, o que também o surpreendeu e o deu “mais responsabilidade”, especialmente pelo fato de que muitos portadores de esclerose e de outras condições degenerativas, bem como outras doenças, entram em contato para dizer que se sentem representados pelo trabalho. “Muita gente vem conversar comigo e diz: ‘Eu acabei de ser representado'”, conta. “A minha intenção era simplesmente contar a história, até por isso que me assustou. Eu vi que tinha uma grande responsabilidade, as pessoas se inspiravam”, afirma.
Doença dificulta o trabalho
A esclerose múltipla tem como principais sintomas fadiga intensa, depressão, fraqueza muscular, alteração do equilíbrio da coordenação motora, dores articulares e disfunção intestinal e da bexiga. Para o cartunista, isso representa uma grande dificuldade de conseguir trabalhar.
“Eu sou canhoto e, infelizmente, a doença se manifestou no lado esquerdo”, conta. Corrêa diz ter dificuldade para caminhar, por isso usa uma bengala, e para controlar o braço e a mão esquerda. “Para desenhar, ficou bem mais difícil. Tem um certo tempo de trabalho que eu tenho que aceitar. A mão cansa, a fadiga é muito grande, a ponto de não ter a destreza”.
Um dos principais reflexos da esclerose em seu trabalho é o fato de que não consegue mais desenhar por muito tempo seguido. “Trabalho meia hora, descanso bastante, para depois retornar. Não tenho como desenhar o dia inteiro como fazia antes. Eu tive que aprender a desenhar de uma maneira diferente, segurar a caneta, respeitar o corpo”. afirma.
Apesar das dificuldades, ele diz que não pensa em deixar de desenhar e passar, por exemplo, apenas a criar histórias. “Eu faço questão de desenhar, porque a estética também faz parte do conteúdo. O desenho precisa ser meu. É muito pessoal”, afirma.
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